DMD NA ESCOLA

É papel da escola ter um ambiente preparado para receber todos os alunos, de forma a realizar as adaptações, quando necessárias, fornecendo condições para o desenvolvimento, não somente cognitivo como socioemocional dos estudantes, principalmente nos casos de indivíduos com desenvolvimento atípico.

Faz-se necessário compreender que a educação inclusiva, engloba diversos fatores, que vão desde adaptações arquitetônicas, estruturais até sobre rotina, locomoção, cuidado, higiene e métodos de ensino. O acolhimento no ambiente escolar deve acontecer de forma natural de modo a atender as necessidades do aluno. O cuidar e educar são indissociáveis, e devem proporcionar as crianças a construção da autonomia, ajudando na formação das suas identidades, sendo possível com isso, que os alunos estabeleçam relações e associações com o mundo a sua volta, se desenvolvendo de forma integral.

Para que o processo inclusivo aconteça de forma saudável e positiva é indispensável o diálogo com as famílias, e profissionais que auxiliam o desenvolvimento da criança, para que sejam percebidas e identificadas as dificuldades e, em parceria, possam ser tomadas as ações necessárias para que a inclusão ocorra de forma satisfatória e afetiva.

Denomina-se aprendizagem o processo de aquisição de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes, possibilitado através do estudo, do ensino ou a da experiência.

A construção de conhecimentos em sala de aula deve ser feita de forma gradativa, adequando-se a cada estágio do desenvolvimento da criança. O professor deve proporcionar situações de aprendizagem em que o aluno participe ativamente desse processo, ainda que a fonte desse conhecimento possa estar tanto no exterior, como meio físico e social, quanto no seu interior.

Na DMD podem ocorrer algumas dificuldades acerca da aprendizagem, porém a maioria dos problemas de aprendizagem está relacionada à velocidade reduzida com que o aluno processa informações como as instruções verbais. Para os alunos do ensino fundamental é importante falar de forma clara e concisa e repetir as informações para garantir a compreensão adequada. Entre os alunos mais velhos, estes problemas de aprendizagem não pioram, e os alunos geralmente superam as dificuldades. Na verdade, muitos jovens com DMD têm inteligência acima da média. Suas habilidades visuais e criatividade são muitas vezes excelentes, e talvez isso possa explicar o fato de que muitos são ótimos artistas. Além de uma avaliação independente da escola, uma conversa com os pais do aluno ajudará o professor a entender melhor o nível atual de habilidades e as necessidades específicas do aluno com DMD.

Atualmente, a descrição dos Transtornos de Aprendizagem é encontrada em manuais internacionais de diagnóstico, tanto no CID-10, elaborado pela Organização Mundial de Saúde (1992), como no DSM-V, organizado pela Associação Psiquiátrica Americana (2013). Ambos os manuais reconhecem a falta de exatidão do termo “transtorno”, justificando seu emprego para evitar problemas ainda maiores, inerentes ao uso das expressões “doença” ou “enfermidade”.

O transtorno de aprendizagem é uma disfunção neurológica que afeta a aprendizagem e o processamento de informações. Diferente da dificuldade de aprendizagem, que é caracterizada como condição passageira que acontece quando influências do mundo externo dificultam o processo de aprendizagem, como, por exemplo, questões emocionais, problemas familiares, alimentação inadequada e um ambiente desfavorável, o transtorno de aprendizagem é permanente.

Transtorno de Aprendizagem é um termo usado para se referir a condições neurológicas que afetam a aprendizagem e o processamento de informações, como a dislexia e a discalculia, alterações no processamento auditivo, transtornos da comunicação, alterações das funções executivas, dispraxia e disgrafia.

Evidências sugerem que as crianças com DMD estão mais propensas a apresentar três tipos de Transtornos de Aprendizagem:

  1. Dislexia;
  2. Discalculia;
  3. Disgrafia.


Dislexia

Dislexia do desenvolvimento é considerada um transtorno específico de aprendizagem de origem neurobiológica, caracterizada por dificuldade no reconhecimento preciso e/ou fluente da palavra, na habilidade de decodificação e em soletração. A dislexia não é um problema visual. É um problema com a divisão e junção de sons durante a leitura. Desta forma, o sinal mais claro da dislexia é quando uma criança sente dificuldade para pronunciar os sons das palavras.  Essas dificuldades normalmente resultam de um déficit no componente fonológico da linguagem e são inesperadas em relação à idade e outras habilidades cognitivas. (Definição adotada pela IDA – International Dyslexia Association, em 2002. Essa também é a definição usada pelo National Institute of Child Health and Human Development – NICHD).

Sinais da dislexia:

Pré-escola

  • Dificuldade para rimar.
  • Problemas para identificar sons iniciais/ finais das palavras faladas.
  • Identificação difícil ou incorreta dos nomes das letras.


Fundamental e posterior

  • Problemas para aprender/lembrar dos sons das letras.
  • Dificuldade para segmentar (pronunciar os sons de palavras).
  • Dificuldade para conectar sons e formar palavras.
  • Olhar para o primeiro ou o último som de uma palavra e adivinhar o resto.
  • Não pronunciar o fim de palavras durante a leitura.
  • Dificuldade para soletrar palavras.
  • Leitura lenta, com dificuldade e sem fluência.
  • Má compreensão da leitura.


Observações sobre intervenções na dislexia:

  • Pedir a uma criança com dislexia para “ler mais” não é uma solução eficaz; estudos mostram que a leitura por si só não corrige o distúrbio e indicam que a maneira mais eficaz de corrigir a dislexia é fornecer instruções fonéticas repetitivas e intensivas.
  • Algumas pessoas pensam que a memorização de palavras (decorar) é uma boa estratégia para crianças com problemas de leitura (ensinando-as a reconhecer a palavra com base em seu desenho ou traçado, e não em sua pronúncia). O problema é que elas tendem a atingir um número baixo de palavras, aquém do necessário para uma leitura fluente. A consciência fonológica e as instruções fonéticas devem fazer parte do processo.
  • As crianças com dislexia esquecem as habilidades de leitura que aprendem se não forem reforçadas ou repetidas. Então, um bom programa de leitura precisa reforçar as habilidades aprendidas anteriormente, em vez de mudar para uma tarefa ou habilidade diferente. É necessário praticar e rever continuamente as etapas anteriores.
  • Seja paciente com a criança ao tentar ensinar habilidades de leitura. Para crianças com dislexia, será um longo processo que exige muita repetição e incentivo para criar confiança e habilidades.


Estratégias de compensação na dislexia

Apesar da intervenção, algumas crianças podem continuar apresentando dificuldade para ler. As estratégias de compensação não “tratam” o problema em si, como fazem as intervenções, mas podem ajudar a criança com dislexia na sala de aula. Abaixo estão algumas modificações que os professores podem fazer.

  • Apresentação oral de novas informações, ao invés de usar a leitura.
  • Permitir o uso de livros em áudio (audiolivros ou livros falados), quando disponíveis, ou permitir que alguém leia o material para a criança.
  • Apresentação e resposta oral em testes e tarefas, pessoalmente ou com o uso de um gravador ou software de reconhecimento de voz.
  • Fornecer mais tempo para a conclusão das tarefas e testes.


Discalculia

A Discalculia é um tipo de transtorno de aprendizagem caracterizada por uma inabilidade ou incapacidade de pensar, refletir, avaliar ou raciocinar processos ou tarefas que envolvam números ou conceitos matemáticos. Percebe-se desde muito cedo, mas é na escola que todos os sinais e dificuldades se expressam de maneira clara e explícita, pois as exigências são maiores e as tarefas que envolvem aritmética e proporções passam a ser rotineiras.

Ladislav Kosc descreveu seis tipos de discalculia: a discalculia léxica, discalculia verbal, discalculia gráfica, discalculia operacional, discalculia practognóstica e discalculia ideognóstica.

  • Discalculia léxica: dificuldade na leitura de símbolos matemáticos;
  • Discalculia verbal: dificuldades em nomear quantidades matemáticas, números, termos e símbolos;
  • Discalculia gráfica: dificuldade na escrita de símbolos matemáticos;
  • Discalculia operacional: dificuldade na execução de operações e cálculos numéricos;
  • Discalculia practognóstica: dificuldade na enumeração, manipulação e comparação de objetos reais ou em imagens;
  • Discalculia ideognóstica: dificuldades nas operações mentais e no entendimento de conceitos matemáticos.


Sinais de Discalculia:

Pré-escola

  • Senso numérico fraco;
  • Dificuldade em combinar numericamente um conjunto de objetos;
  • Dificuldade em relacionar numericamente duas fileiras de blocos/ objetos.
  • Dificuldade para estimar quantidades;


Fundamental e posterior

  • Dificuldade para contar de trás para a frente;
  • Dificuldade para lembrar de fatos matemáticos básicos, mesmo tendo passado por muitas horas de prática;
  • Dificuldade para entender o valor posicional de algarismos;
  • Dificuldade para entender a função do número zero no sistema numérico hindu-arábico;
  • Esquecimento de estratégias matemáticas, principalmente de procedimentos longos com várias etapas, como a divisão de números grandes;
  • Dificuldade para guardar números na memória de trabalho enquanto resolve problemas matemáticos;
  • Ansiedade relacionada à matemática e qualquer outra atividade que envolva números;
  • Lentidão para fazer cálculos;
  • Habilidade de aritmética mental fraca em relação à idade ou nível de escolaridade;
  • Dificuldade para aprender a ler a hora;
  • Dificuldade para calcular o tempo.


Observações sobre intervenções na discalculia:

Para aprimorar a construção de conceitos matemáticos para crianças com discalculia é indicado o uso de objetos tangíveis e exemplos da “vida real” na aprendizagem. O uso de material concreto como ábaco, material dourado, soroban (ábaco japonês), também devem e são indicados para facilitar o aprendizado.

Para adquirir habilidades em operações numéricas, a criança exercita várias coisas, incluindo memorização mecânica de operações matemáticas (por exemplo, contagem/sequência para crianças pequenas, tabelas de multiplicação para crianças mais velhas) e memorização de procedimentos matemáticos (por exemplo, estratégias ou etapas para resolver um problema).

Estratégias de compensação na discalculia

As estratégias de compensação não “tratam” o problema em si, como fazem as intervenções, mas podem ajudar a criança com discalculia na sala de aula. Abaixo estão algumas modificações que os professores podem fazer:

  • Fornecer espaço para resolver cada problema na folha de testes e tarefas, de preferência uma situação por folha.
  • Colocar as etapas para a resolução do problema na parte superior da página ou em um cartão e listar as etapas verticalmente, de cima para baixo.
  • Permitir o uso de uma linha com a sequência dos números.
  • Permitir o uso de uma tabela de operações matemáticas ou calculadora.
  • Aumentar o tempo de testes e tarefas.
  • Considerar a possibilidade de reduzir o número de problemas; foco na qualidade versus quantidade se a tarefa receber nota.


Disgrafia

Escrever é talvez a tarefa acadêmica mais difícil de dominar, pois exige a integração bem-sucedida de várias habilidades. Problemas com força muscular, destreza motora fina ou planejamento motor podem tornar o aspecto físico da escrita uma tarefa difícil e frustrante para algumas crianças. As crianças com problemas nas habilidades de linguagem podem ter dificuldades relacionadas à ortografia, gramática e sintaxe. Deficiências nas funções executivas podem resultar em dificuldades para iniciar, planejar e organizar projetos de escrita mais longos.

São descritos dois tipos de disgrafia: a motora (discaligrafia) e a perceptiva. Na disgrafia motora, a criança ou adulto conseguem ler e as dificuldades serão maiores na coordenação motora fina para escrever as letras, palavras e números, ou seja, visualiza a figura gráfica, porém apresenta dificuldade em fazer corretamente os movimentos para escrever. É necessário alertar que é indispensável o acompanhamento de um profissional de terapia ocupacional, pois ele poderá avaliar juntamente com o psicopedagogo se as dificuldades apresentadas são provenientes de uma disgrafia, ou curso de evolução da DMD.

A disgrafia perceptiva é a dificuldade ou incapacidade de fazer relação entre o sistema simbólico e as grafias que representam os sons, as palavras e as frases. Se diferencia da dislexia pois esta está ligada à leitura e a disgrafia está associada à escrita.

Sinais da Disgrafia:

  • Dificuldade para escrever ou escrita marcada pela junção de letras maiúsculas e minúsculas;
  • Escrever letras com formatos diferentes, muito juntas ou incompletas;
  • Emprego de força ou pressão exageradas no momento da escrita;
  • Caligrafia comprometida;
  • Dificuldade em realizar cópias;
  • Troca de letras com sons semelhantes;
  • Adições incoerentes nas palavras;
  • Fragmentações incorretas em palavras;
  • Escrever palavras com omissões de letras, inversões, junções ou confusões de sílabas.


Observações sobre intervenções na disgrafia:

Para que a criança treine a habilidade motora fina ou planejamento motor é fundamental que faça um acompanhamento de terapia ocupacional para melhorar as habilidades de controle do lápis, por exemplo. Atendimento com psicopedagogo para elaboração de programas estruturados de escrita também são extremamente importantes.

Os problemas de ortografia geralmente estão relacionados ao déficit no processamento fonológico. As intervenções devem ter como foco os aspectos da ortografia em que as crianças têm problemas.

Por exemplo:

  • Instruções para contar sílabas.
  • Instruções sobre regras básicas de ortografia (por ex.: uso de “m” antes de “p”, etc.).
  • Instruções sobre divisão e junção de palavras.
  • Memorização de palavras comuns que são exceções às regras de ortografia.


Estratégias de compensação na Disgrafia

As estratégias de compensação não “tratam” o problema em si, como fazem as intervenções, mas podem ajudar a criança com disgrafia na sala de aula. Abaixo estão algumas modificações que os professores podem fazer:

  • Reduzir as tarefas com papel e lápis e diminuir as tarefas de escrita repetitiva, mas não alterar os elementos essenciais.
  • Para alunos mais velhos, acompanhar as tarefas de escrita com etapas e instruções bem específicas, listas de sequências etc.
  • Fornecer cópias de slides, anotações do professor e resumos de palestras para que o aluno não perca informações importantes ao tentar fazer anotações. Quando o aluno receber anotações/resumos, solicitar alguma atividade do aluno para manter sua participação ativa no processo de aprendizagem, como destacar palavras-chave com um marcador.
  • Fornecer uma oportunidade para respostas orais em testes ou tarefas e/ou permitir ditado.
  • Não fornecer notas pela caligrafia ou legibilidade. Permitir o uso de letra cursiva ou letra de forma, o que for mais legível.
  • Permitir o uso de tecnologias, como softwares de transcrição de áudio para texto.
  • Não considerar na nota os erros de ortografia, gramática ou pontuação em tarefas rápidas em sala de aula.
  • Modificar os formatos dos testes para aumentar a estrutura. Por exemplo, ao invés de uma pergunta geral, elaborar testes com perguntas de múltipla escolha, verdadeiro/falso ou preenchimento de espaços em branco.

REFERÊNCIAS​

1 HADDAD, Lenira. Um novo paradigma na integração do cuidar e do educar. Porto Alegre: Artmed. Revista Pátio Educação Infantil. Ano I nº 1 abril/ julho, 2003, p. 10-12.

2 FARIA, ANÁLIA RODRIGUES DE. Desenvolvimento da criança e do adolescente segundo Piaget. 4ª. ed. São Paulo: Ática, 1998. Capítulos 1 e 3.

3 Piletti N, Rossato SM. Psicologia da aprendizagem: da Teoria do condicionamento ao Construtivismo. São Paulo: Contexto; 2011.

4 Education matters: adaptive physical education. Parent Project MD, 2021. Disponível em: https://www.parentprojectmd.org/wp-content/uploads/2018/04/EdMatters_AdaptivePE.pdf Acesso em: 29/02/2021.

5 Souza I, Serra MA, Mattos P, Franco VA. Comorbidade em crianças e adolescentes com transtorno do deficit de atenção. Arq Neuropsiquiatr 2001;59:401-6.

6 MORAES, Paula Louredo. “Discalculia, sintomas, causas e tratamento”; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/doencas/discalculia.htm.

7 Kosc, L. (1974). Developmental Dyscalculia. Journal of Learning Disabilities.